domingo, 20 de julho de 2014

Meu Limão, Meu Limoeiro... Meu pé de Mortadela!

Não convivi com meu avô paterno. Lembro de tê-lo visto umas cinco vezes e era um cara sisudo. Nunca sorriu pra mim, mas isso nunca me causou dano. Foi na minha vida um gás inerte.
Meu pai não se dava com ele. Tinha seus motivos. Teve uma infância marcada por um pai violento, mas ainda assim, houve momentos da minha vida em que me lembro dele falando com ternura de poucas gaiatices da figura em questão.
Uma das histórias que jamais esqueci foi a de quando, á mesa ele apontou a pimentinha dentro da mortadela e disse:
- Está vendo isso? É uma semente de mortadela!
Os três filhos deslumbraram-se com a possibilidade de ter no quintal um pé de mortadela e no mesmo dia plantaram a semente num lindo vaso!
Todos os dias, religiosamente, regavam de manhã, à tarde e à noite.
As três crianças inocentes dedicavam todo o seu amor a esse projeto mas, com o passar do tempo viam que não havia resultado. Vez ou outra, aparecia um matinho e era uma alegria imensa, mas eles logo notavam que tratava-se apenas de capim...
A frustração ia brotando no rosto das crianças, mas elas nunca admitiram a possibilidade de o pai ter mentido. Afinal, era o mestre-soberano-papai-sabe-tudo!
A desistência não tardou e até hoje eu não sei se ele chegou a desmentir a história ou se simplesmente caiu em desuso, perdeu a graça...

Recentemente lembrando-me dessa história, fiz uma analogia.

Estava eu, aos trinta e dois anos de idade, plantando mortadela!
Plantara uma sementinha que, sobre a qual, por mais amor que eu despejasse, não brotaria. Porque mortadela não nasce em árvore.
Não era problema na terra. Ali habitavam outros seres viventes!
Não era negligência. Ali eu aguava todos os dias.
Com o passar dos tempos, a criança em mim experimentou a frustração e, como acontece com alguns brinquedos, logo veio o desinteresse!
Vez ou outra, olhava o vasinho num canto e me lembrava da alegria tamanha de ver ali a possibilidade de uma mudinha brotando. Depois suspirava lamentando e ia me dedicar a outra atividade! Como se aquela empreitada não tivesse importância!
Um dia descobri que não se tratava de uma semente de mortadela. Disseram-me: "Isso é pimenta!"
E deslumbrei-me com a possibilidade de ter uma arvorezinha com aqueles pingentes vermelhos!
Brotou em mim novamente uma onda de ternura e encantamento e dediquei-me religiosamente a cuidar daquela pequena vida!
Nada.
Então entendi.
Era pimenta. Mas ela não brotaria.
A missão daquela pimentinha era tão somente dar sabor à experiência de uma mordida.
Uma experiência que quando acaba, deixa gostinho de "quero mais".

Entendi que nem o amor mais puro tem o poder de mudar a natureza das coisas!

Então fui à cozinha, fiz uma limonada e brindei a possibilidade de mudar, na minha vida as coisas que estão ao meu alcance. E Pus-me a pensar no que fazer com o vaso!

E ali está ele, olhando pra mim como quem espera, pacientemente um destino...
E pensei que também fui, por um tempo um vaso a esperar...