sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

:: perdido na noite

Há tempos não ouve o ruído das estrelas.
Conta as batidas do coração no marasmo das horas no sofá.
Já não tem números nas mãos, perdeu as contas.

Na desordem da cozinha, não encontrava o pão de forma vencido ou os pacotes de miojo.
Contentou-se com leite da geladeira e o achocolatado do armário.

Vai para o quarto.

Olha pela janela com a caneca quente entre as mãos.
Chega até o outro lado do horizonte sem se dar conta da viagem. Do caminho.
Já que chegou, uiva para a lua.
Ela nem está cheia mas o peito transbordando toma a iniciativa.

No uivo, não perde o volume de emoções há tempos acumulado.
Volta para a sala.
Perde-se no ninho, no canto de um cômodo que sempre foi alegria.

Tem algo na TV. Tem algo entre os dedos. Tem algo no copo.

Tem tudo no peito.
E quase nada sai da cabeça.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

:: adeus

Acordo.

Olho para o teto e ele gira.
Fecho os olhos num aperto como se fosse o freio para aquilo.
Claro, não adiantou!

Sento. Não lembro.

Olho em volta e tento contar as garrafas vazias espalhadas.
Perco as contas.
Elas estão em movimento, não dá para acompanhá-las.

Cinzeiro virado. Almofadas pelo chão.

No computador, a pasta com músicas está escancarada.
A subpasta aberta me dá o primeiro indício do que houve...

Não, não é o mundo pós-apocalíptico...
é só minha sala depois do adeus.



domingo, 8 de fevereiro de 2015

Não é assim

De novo...
Mas diferente!

Aquele olhar que atravessa o salão e se detém num mover tão comum,
Um sorriso igual...
Tão simples!

Um caminhar natural até o meio-fio, como se nada fosse
Um giro de cabeça e um beijo sem pedir licença,
Sem desculpa

Olhos que falam...
Como pode?
Olhos que falam!

Boca que confirma.

Corpo que foge

Alma que cai

Coisa...
Uma coisa que atravessa e tira o ar!
Uma coisa que quase faz doer...

"é cedo. CEDO!"
- Porque tudo tem seu tempo...

- Não temos tempo!
- Por isso...
- Ainda assim...
- Não...
- Não minta...
- Ok...

...
- Bom dia! Café?
- Foi de verdade... e será... e é!

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

:: pedaços

Os grampos do seu cabelo ficaram aqui.
Estão no mesmo lugar que deixou.
Os odeio. Sempre os odiei.

Tem também um batom.
De todos os seus batons, tinha que largar por aqui justamente este vermelho?
Como detestava o sorriso dele.
Irrito-me ao lembrar dos beijos que ele dava em minha boca.
As marcas que deixava perturbam até hoje.

Ficou aqui seu chinelo.
Que garota não toma banho descalça ao menos uma vez na vida?

Já lavei os lençóis, a cortina, as toalhas, os panos de prato. Coloquei os travesseiros sob o sol. Nada adiantou.
Seu maldito cheiro fica zanzando entre estas paredes.

Inclusive,
a porra do seu creme diz boa noite a madrugada inteira.

Por aqui ficaram alguns anéis. Ridículo usá-los em par. Um no indicador e outro no médio.
Mas nada tão horroroso quanto os esmaltes vermelhos. Têm arranhões rubros em todas as paredes.

Sua caneca ocupa um espaço desnecessário.
Seu cinzeiro não tem utilidade.
Sua azálea está morrendo.

E para que serve-me o quadro que inventou pintar e colocar na parede da cama?
Para que servem os carrinhos que colocou na minha estante?

Os filmes que baixou deixam meu computador lento.
E o tapetinho na beira da pia só serve para sujar.

Garota, por favor, apareça.
Faça as malas.
Recolha seus pedaços.
Preciso recolher os meus.